Se você convive com um idoso e já passou por esta situação, sabe que muitas vezes pode ser desesperador, não é mesmo?
Sempre lemos relatos de familiares desesperados, seja porque o idoso não reconhece mais a própria casa e quer ir embora, ou porque ele acabou fugindo! (o que pode ocasionar em situações gravíssimas!) Mas fica a questão:
PARA QUAL CASA O IDOSO QUER IR EMBORA?
Eu acredito em algumas opções:
1) A CASA DE INFÂNCIA DO IDOSO (OU OUTRA CASA EM QUE VIVEU):
Muita gente pensa logo de cara:
"Ah... é a casa que ele viveu quando era criança"
E talvez pode ser sim, mas não é a única possibilidade (no decorrer do texto eu explico o porque), pois no caso do meu avô não era assim que acontecia.
Inicialmente as memórias mais recentes são as primeiras a serem esquecidas, sendo assim, pensar que ele quer voltar para uma casa antiga é o que vem inicialmente à nossa mente, seja ela de infância, adolescência ou de outra fase de sua vida!
2) O CASO DO MEU AVÔ:
Todos os dias na hora de ir para a cama meu avô perguntava para a minha avó:
"A gente vai dormir aqui ou na casa de baixo?"
Certa noite que fui dormir na casa deles, perguntei: RENAN: Vô, eu não to lembrado que casa é essa... o senhor consegue me falar?
VÔVS: Uai, é aquela lá de baixo! RENAN: Ah tá... e como ela é mesmo?
VÔVS: É que nem essa daqui. Tem essa estante, e essa televisão... aí tem essa cama também, a penteadeira... é igualzinho essa casa... mas é outra.
Ou seja, ele sabia que a casa dele era essa (a atual), porém, eu interpretei que ele não se sentia em casa, já que ele descrevia a casa em que vivia, mas queria ir embora para a mesma casa. Mas o que é se sentir em casa? Sabe quando você sai de casa e passa uma temporada na casa de alguém? Ainda que o passeio seja bom, nada é como estar de volta ao nosso lar. E talvez, por todas as coisas que aconteciam por aqui*, ele estava com aquele sentimento de: "querer ir pra casa", pois não se sentia em casa.
*(minha vó estava em tratamento no Hospital de Câncer)
Se isso faz algum sentido? Bom, fez para mim... muitas coisas a gente tenta buscar interpretação pra tentar encontrar algum sentido (muitas vezes não dá certo, e o melhor é só aceitar que é a doença mesmo).
Mas pra mim, isso fez muito sentido...
E QUANDO O IDOSO INSISTE EM IR EMBORA, O QUE A GENTE FAZ?
Vou dar três exemplos de situações que aconteceram enquanto eu e minha mãe cuidávamos do Vôvs!
1) DAR UMA VOLTA NO QUARTEIRÃO, OU FAZER UM PASSEIO MAIOR:
Quando meu avô começava com a ideia de ir embora ou fazia menção à isso, eu falava pra ele:
Vôvs, então vamos!
Andávamos pelo quarteirão, eu o distraia perguntando sobre as plantas e árvores, e depois de um tempinho voltávamos pra casa... Mas repare nos truques: Se eu saía de casa pela esquerda, na hora de voltar a gente vinha pela direita! Assim o caminho era diferente e contribuía para ele não desconfiar que era a mesma casa.
E na hora de entrar, eu também dizia: "Ufa... ainda bem que chegamos em casa né vô?"
Ele concordava, e a vida seguia... :)
2) ESTAMOS SEM AS CHAVES DE CASA!
No primeiro ano cuidando dele, eu fazia estágio na Universidade. Como os cuidados com meu avô se baseavam em dar a medicação correta e fazer companhia, ele passava a tarde com a minha mãe que sempre estava em casa! Quando ele falava coisas como "Já está dando hora de ir embora". Minha mãe ia enrolando ele dizendo:
Então Sr. José, daqui um pouquinho o Renan está aqui! Pois ele saiu, e levou as chaves! Então a gente tá aqui sem poder abrir o portão... tá? Daqui a pouco o café fica pronto também... aí a gente toma!
3) SE NÃO PUDER SAIR DE CASA, USE QUALQUER DISTRAÇÃO:
Houve uma vez, e essa foi a que ficou mais marcada em nós, que o meu avô simplesmente se levantou do sofá e falou:
"Escuta, eu vou indo lá! Vocês fiquem com Deus, pois o pessoal lá está me esperando."
Okay. E agora?
Corri até o portão e falei:
RENAN: Vô me espera, eu também vou aproveitar e vou com o senhor... mas eu precisava que o senhor me ajudasse com uma coisinha aqui!
VÔVS: Então vamos...
RENAN: Levei-o até o meu quarto e chegando lá não sabia o que fazer. Olhei em volta e vi minha estante de livros! Ao lado havia uma série de marcadores de página. Então eu disse:
RENAN: Vôvs, a gente precisar pegar esses livros aqui, colocar na cama e abrir cada um deles pra colocar esse marcador aqui. Pode ser?
VÔVS: E porque?
RENAN: Ah vô... meu pai me pediu e se ele chegar e eu não tiver feito, ele vai me encher ...
VÔVS: Então vamo agilizar isso aqui...
Meu avô sempre foi muito organizado, então durante todo o processo ele abria um livro... colocava o marcador... fechava o livro... e o posicionava junto aos outros de forma que ficassem todos alinhados! (Deu pra imaginar o tempo que isso levou né?) 😁
Antes de completar 30 minutos do trabalho ele falou:
Já está bom, né?
Antes que ele terminasse a frase, eu já completei dizendo:
ESTÁ SIM, VAMOS TOMAR CAFÉ?
Prontamente ele respondeu: "ENTÃO VAMOS".
FIM: ACABOU A VONTADE DE IR EMBORA.
Basicamente a ideia é: TIRAR O FOCO do que ele está em mente:
Se ele diz que quer ir embora, então você pode substituir isso por frases como:
"Está bem, mas me ajuda com a louça aqui rapidinho?
"Então vamos, mas primeiro a gente precisava guardar aquelas toalhas né?"
"E o que acha da gente arrumar o quarto primeiro? Não dá pra sair e deixar desse jeito né? Você me ajuda?"
... logo em seguida à finalização da tarefa você coloca outra coisa no lugar, antes que a lembrança de ir embora volte! Como por exemplo:
"Então agora que acabamos podemos ir ver a nossa novela! Parece que vai estar boa hoje!"
"Daqui um pouco a gente prepara a janta, aí a senhora me ajuda né? Nossa, que bom que a senhora tá aqui pra me ajudar a separar o feijão... ninguém aqui tem paciência pra isso"
"Que bom que o senhor tem me ajudado pai, assim a gente fica mais protegido com o senhor por perto né?
ELES SÓ QUEREM ESTAR EM UM LUGAR QUE SERÃO ÚTEIS. DÊ ESTA UTILIDADE À ELES (DENTRO DOS LIMITES) E DEMONSTRE GRATIDÃO!
Quero salientar que muitas vezes as dicas podem não funcionar com todos os idosos, mas siga a ideia principal de mudar o foco que pode dar certo! Em alguns casos, o idoso pode nem vir a precisar de medicação para se acalmar ou diminuir esses sintomas, basta a gente ter outro olhar sobre a situação e tentar a COMUNICAÇÃO!
Infelizmente muitas pessoas acreditam que deixar o paciente sedado é a solução. Creio que há momentos extremos em que o idoso correria até mesmo riscos sérios se não estivesse contido ou medicado... Então, o médico é quem saberá da necessidade!
Mas nem todos os casos são assim, converse um pouco mais com seu médico sobre como resolver as situações de forma que o idoso se sinta confortável. Afinal... essa é a nossa missão como cuidadores: trazer conforto... e de preferência, com AMOR.
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